Sunday, May 18, 2008

Saudade do chicote ajuda filme novo

Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com

Poucas obras do cinema de entretenimento foram capazes de fazer queixos de todas as idades cair tantas vezes ao longo de duas horas como Os Caçadores da Arca Perdida, em 1981. Com um herói simpaticíssimo (um charmoso e pragmático ladrão americano de culturas estrangeiras, seu campo é a arqueologia) e vilões que mereciam mesmo ser derretidos (nazistas), o primeiro filme teve dois outros episódios inferiores, mas fenomenalmente populares – Indiana Jones e o Templo da Perdição (1984) e Indiana Jones e a Última Cruzada (1989). Entre Caçadores... e a estréia mundial de ontem do quarto Indiana Jones, foram-se 27 anos e, tendo isso em conta, difícil ser objetivo com um quarto episódio visto já perto dos 40 anos de idade, em relação a um outro desfrutado, na sua plenitude, aos 13.

Nesse período, o cinema assimilou o estilo Indiana num sem número de imitações e a ação filmada tornou-se cada vez mais apressada. Spielberg, mesmo assim, disse na coletiva de imprensa gostar dos filmes Identidade Bourne e considera o recente Cassino Royale "o melhor James Bond desde Moscou Contra 007"). O perigo seria fazer o novo Indiana Jones uma cópia dos seus imitadores, algo que não ocorre. De fato, mesmo podendo tê-lo como uma decepção, Spielberg fez um filme dele, fiel em espírito ao universo criado (uma imagem rápida de um elemento importante do passado gera enorme prazer...).

A marcha tema de John Williams volta para lembrar que além de imagens icônicas (o chapéu, o chicote), esses filmes são também som. Em nenhum outro filme tiros têm o som que têm aqui, murros e carros batendo também. Exibido em poderoso volume racha dente em Cannes (há alguma outra maneira de ver o filme?), a equipe de som conseguiu ainda nos dar uma explosão sonoramente visceral no seu ineditismo, literalmente uma bomba atômica num momento destacado. É um feito e tanto num cinema de entretenimento que, nessas duas décadas passadas, não poupa nunca em barulho.

Harrison Ford, aos 65, ocupa bem o espaço, sem esconder os anos. O cara tem carisma, não seria o astro que é se não tivesse. O departamento de marketing parece trazer um parceiro adolescente (Shia Lebouf), sua presença clara e evidente: oferecer aos jovens uma figura heróica de fácil identificação, personagem que vem ainda com uma revelação interessante...

A dupla embarca numa aventura cronologicamente correta (1957, Caçadores foi 1936) onde os vilões absurdos são agora soviéticos. A mesma fala antes aplicada a Hitler vai agora para os comunistas "vasculham o mundo por objetos de poderes ocultos geradores de poder". Cate Blanchett é a vilã russa com channel preto, uma boneca histérica que dá má fama a figuras de papelão. Karen Allen, a maravilhosa namorada de Caçadores, finalmente volta, mas o clima de confraternização só aumenta.

Não há cena alguma nesse filme que chegue aos pés de qualquer uma das cenas memoráveis de Caçadores..., ou da abertura de Templo da Perdição. Há uma sensação de que tudo ficou menor, a começar pela clássica imagem da Paramount, aqui transformada em fusão numa piada que serve bem para definir a estatura do que veremos a seguir. Foi-se o sentido de "grande aventura", mas fica pelo menos a aura de uma, um pouco como um brinquedo Indiana Jones num parque americano, ou um videogame da série.

Objetivamente, a Lucasfilm terá não só o sucesso mundial por pura antecipação e curiosidade de milhões de fãs, mas deverá também entreter novas gerações com essa aventura que, mesmo soando como uma confraternização de final de ano, traz de volta o universo tão familiar já tão estabelecido. Na verdade, Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal realmente tem um certo clima de pais e filhos indo juntos ao cinema que me parece saudável e saudoso. Talvez seja a nostalgia que vem junto.

3 comments:

Osvaldo Neto said...

Estou muito ansioso para ver!

Não sei se vc está sabendo disso aqui, te mandei um e-mail... esses caras estão em Cannes vendendo os seus filmes:

http://www.theasylum.cc/product.php?id=143

João Solimeo said...

Bom, Kleber, realmente o clima de nostalgia é enorme. Fui ver na pré-estréia aqui no Brasil e, para minha surpresa (talvez ingênua), o cinema estava lotado. O mesmo aconteceu na sessão seguinte que eu, fã que sou, paguei para rever. Há sim um clima de algo "menor" neste filme, mas levando em conta o que Lucas fez com as suas "prequels" de Star Wars, há de se convir que poderia ter sido muito, muito pior. Acho que podemos agradecer a Spielberg e Ford por terem "segurado a chama"...mesmo que esta chama seja apenas a de um palito de fósforo. O fato é que me diverti muito e ri do clima propositalmente absurdo da projeção. Uma colega de poltrona, que no início estava toda séria e fazendo comentários cínicos sobre o filme, lá pelo meio já estava às gargalhadas também.
Abraço.

CinemaScópio said...

continuo achando que a imagem síntese do filme é a montanha da Paramount no início se transformando num montinho de areia. Mas, de fato, poderia ter sido pior.