Tuesday, February 3, 2009
O Corajoso Ratinho Desperaux
por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com
Uma animação que não consegue livrar-se do fantasma de Ratatouille, O Corajoso Ratinho Desperaux (The Tale of Desperaux, EUA, 2008) estréia hoje, programa de qualidade garantida para as férias infantis, já que o direcionamento de mercado para o filme é exatamente esse. Com a prática da dublagem (que faz parte desse direcionamento), o vistoso elenco apresentado nos créditos de abertura torna-se inútil (Dustin Hoffman, Mathew Broderick, Sigourney Weaver), sobrando a fluente narrativa visual e as vozes cariocas que saem da tela.
Como no excelente filme da Pixar de dois anos atrás, esta é a história de um ratinho que irá desafiar os obstáculos para mostrar-se um grande herói. O pequeno Desperaux (menor do que os outros ratinhos já pequenos) e com orelhas de Dumbo é o personagem de um livro, lançado no Brasil pela editora Martins Fontes – A História de Desperaux, de Kate DiCamillo.
Há um tom de fábula, bem diferente da histeria colorida de Madagascar 2, e o cenário do filme sugere a Europa dos contos clássicos, um lugar chamado Dor, alguma localidade nórdica onde a sopa é o principal prato que une o povo. Sendo esta uma obra americana, o sistema de preparação artesanal da grande sopa pelo chef francês e dezenas de cozinheiros é apresentada como uma linha de montagem numa grande fábrica que administra frutas e legumes em esteiras industriais e roldanas de madeira.
Em momentos de dúvida na hora de temperar, o chef é visitado por uma espécie de entidade do sabor, talvez a criação visual mais interessante de todo o filme, misto de espantalho com horta ambulante, sua cabeça um jerimum, rosto, boca e nariz de picles, cenouras e outros membros honorários de uma boa salada. Toda a ação dentro da grande cozinha não ajuda muito o espectador no sentido de esquecer Ratatouille, que era sobre um ratinho com talento nato para a alta comida.
O filme, na verdade, começa com um personagem nos informando que ele não será o principal. Roscuro é uma ratasana de navio que, seguindo o olfato, vai parar na cozinha real. Um incidente no qual ele é o principal protagonista leva a rainha à morte durante um jantar oficial. O rei, inconformado com a perda, decreta o banimento de sopas, ratos e ratasanas do seu reino.
É nesse clima de medo e depressão que nasce o pequeno Desperaux, que a história nos mostrará o quanto é diferente da norma. Gosta de gatos e tem curiosidade pelos humanos. É tido como corajoso (rouba queijo de ratoeiras com um salto mortal) e logo desenvolve o desejo de querer ser um cavaleiro que poderá conquistar a princesa. Ele irá descobrir o submundo das ratasanas, que o filme parece nos mostrar como se fosse a sua própria versão do terceiro mundo. Lá as ratasanas são atrasadas e comem comida estragada.
A animação de Desperaux é realmente muito boa, sem conseguir nos mostrar nada de realmente novo. Percebe-se uma clara dificuldade de dar conta dos personagens e incidentes do livro, tudo sob uma camada esforçada e industrial. Não é um filme orgânico como os da Pixar, mas apenas um produto que almeja o bom gosto, e, de certa forma, acerta.
Filme visto no UCI Boa Viagem, Recife, janeiro 2009
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