Monday, August 4, 2008

Do Cinema Direto Para a Promoção de Lingerie



Emmanuelle 'A Verdadeira' (com Sylvia Kristel), Art-Palácio, Recife, 1980, época em que o filme de 1974 foi finalmente liberado pela censura "sem cortes".

Conversando com alguns amigos cinéfilos, surgiram algumas dessas idéias.

Rodrigo Costa, carioca, lembra que no Rio há o exemplo do Arteplex em Botafogo, que é um "multiplex de rua", algo raro na configuração atual. Para ele, "O multiplex melhorou a qualidade de projeção e som. O que veio de ruim é você ter que entrar num shopping para ir ao cinema. Isso denota como o cinema é, cada vez mais, uma diversão que perdeu o contato com o cotidiano, com a rua. As filas dos cinemas de rua, você as via passando de ônibus em frente aos cinemas. Isso acabou".

Numa região tropical, a migração de atividades populares antes oferecidas na rua para espaços fechados e privatizados reflete o aspecto "caracol" de uma sociedade que vive com medo, trancada num mundo artificial e refrigerado. No Recife, a idéia de "rua" é cada vez mais vista como algo a ser evitado, e a noção de proteção leva a sociedade como um todo a se fechar, o que me faz lembrar da população do Axiom, em Wall-e.

"Poder ir ao cinema e depois resolver algo no shopping é muito bom, sim. Também gosto de poder dar uma volta após o filme, enquanto se decide para onde ir em seguida, com calma", me disse o estudante Bruno França, 26 anos.

Já Katarina Peixoto, 35 anos, cinéfila pernambucana que mora em Porto Alegre, ela sente o impacto da mudança pesando os dois lados. "Na década de 90, a violência do Recife foi tornando a experiência de ir aos cinemas do centro algo lamentável. Hoje, no entanto, num multiplex de shopping, é como sair de um museu e cair numa promoção de lingerie".

Para Francisco Lacerda, outro cinéfilo pernambucano, "percebo uma separação clara de públicos, pelo preço. No multiplex do Shopping Boa Vista, mais popular, preços mais acessíveis, vejo o mesmo público que freqüenta(va) o Parque, São Luiz e Veneza. Já nos multiplexes Recife, Tacaruna, Guararapes, é classe média e média alta.

Ele sente uma diferença de postura entre esses públicos. "Ambos são barulhentos, mas o popular faz barulho 'com' o filme, interage, se diverte. Já no outro, parece que está ali obrigado, entediado, fala no celular, acho que vem do ato robótico de ir ao cinema no final de semana, parece que eles não queriam realmente estar ali", pondera.

As mudanças mais óbvias ao longo dessa década foram uma noção de qualidade importada. Dos cinemas de rua equipados com projetores e sistemas de som ultrapassados made in Brazil vieram projetores e amplificadores estrangeiros, som Dolby e também poltronas largas com porta copos, desenhadas para estimular uma outra filosofia lucrativa transplantada para a cultura brasileira: o consumo de quantidades industriais de pipoca, nachos, chocolates e refrigerantes, rica fonte de faturamento para as empresas. K.M.F

PS:


Eu recebi uma cópia PiratoScope de Iron Man (que eu perdi nas salas), e com 20 segundos de filme, vi esta que deve ser a imagem síntese do cinema multiplex hoje: FILME DE SUPER HERÓI + MCLANCHE FELIZ COM COMBO DE PIPOCA. Desacelerei 40% para ficar mais style, olhem bem.

2 comments:

krelid said...

vagabundo, incrível, demais!

caco/carlos/nigro said...

hahaha
e eu pensando em mensagem subliminar...

muito boa!