Saturday, February 28, 2009

Pride and Glory (Força Policial)


por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


O cinema americano é pródigo em filmar castas masculinas, irmandades que operam juntas dentro dos seus códigos internos e regras sociais conhecidas. De fuzileiros a bombeiros, de esquadrões de elite a policiais, Hollywood adora filmá-los dando ênfase na retidão moral heróica que sobrepõe-se a eventuais desvios de conduta. Esse é o caso de Força Policial (2009), filme de Gavin O’Connor, thriller levemente acima da média com Edward Norton e Colin Farrell.

O título original – Pride and Glory (Orgulho e Glória) – é pinçado diretamente do distintivo da polícia de Nova York, da mesma maneira que “We Own the Night” também consta no uniforme de uma outra casta policial nova-iorquina em Os Donos da Noite (2007), filme de James Gray que teve a sorte de vir antes desse aqui, e de ser melhor.

As semelhanças entre os dois filmes existem no elemento “família”. Temos duas gerações de policiais, aqui pai, filhos, primos e cunhadas. Jon Voight é o patriarca, Edward Norton é o filho dele, um investigador que recupera-se de um trauma, saindo aos poucos de um serviço burocrático auto-imposto, e também do seu casamento.

O policial de Farrell, casado e com filho, é um primo que está metido num esquema sem futuro que envolve a extorsão brutal dos piores traficantes da área e uso generalizado de violência para obter respostas (ele ameaça queimar um bebê com um ferro de passar roupa, à certa altura).

Ele trabalha na divisão chefiada pelo irmão do personagem de Norton (Noah Emmerich), tipo do bem que tenta administrar as frutas podres da sua cesta e ainda lidar com a doença terminal da sua esposa. É aquele tipo de filme que tenta investir no elemento humano, escola Michael Mann ou o já citado James Gray, dando ao tom geral de thriller de ação algo mais substancial. Curiosamente, são os dois irmãos de Norton e Emmerich que mais se destacam, deixando boas impressões.

Para o espectador brasileiro, esse tipo de ação policial tem a credibilidade (vide Tropa de Elite) que, para alguns, pode soar um tanto extrema em relação à polícia de Nova York, em tempos atuais. Numa cena, em especial, quatro policiais da banda podre põem fogo numa vítima do esquema dentro de um carro a plena vista de toda a cidade e ponte do Brooklyn ao fundo, e de alguma forma, a execução a pneu queimado em Tropa de Elite (em plena vista da cidade do Rio de Janeiro) soa bem ais crível.

Mesmo assim, O’Connor filma ao nível da rua e com uma urgência que sempre prende a atenção, em especial pelo fato de o personagem de Norton estar à frente da investigação que revela, pouco a pouco, o mau cheio da corrupção não só na polícia, mas dentro da sua própria família.

Sabe-se que Força Policial teve sua produção adiada no início da década depois dos ataques do 11 de setembro, uma vez que o clima geral de gratidão da cidade de Nova York para com a sua força policial não combinaria com a trama sombria do filme. O filme ainda teve o azar de ficar quase três anos nas prateleiras da New Line em momento de transição (foi comprada pelo grupo Time Warner), pois foi rodado em 2006, provavelmente simultâneo ao filme de Gray. Tem qualidades.

PS: porquê os filmes atuais são sempre tão escuros?

Filme visto no UCI Ribeiro Boa Viagem, Recife, Fevereiro 2009

Monday, February 23, 2009

Oscar Sarau



Sarau em casa vendo mais uma cerimônia de entrega do Oscar. "Isso é Joacquin Phoenix?"

Por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


A cerimônia do Oscar é sempre uma proposta interessante, com inevitáveis barrigas no meio que afundam o todo, levantando o interesse no final com os prêmios principais.

Esse ano, tentaram transformar a coisa num esquema sarau na grande sala de estar de Hollywood, apresentadores e ganhadores numa relação de proximidade semelhante à de um show de banquinho e violão, diferente da distância tradicional entre púlpito e platéia. Um plano de câmera de trás e de cima achatava tudo e mostrava bem essa proximidade.

A valorização do ator (ou do astro, não sei) foi sublinhada esse ano com as quatro categorias ganhando quatro ou cinco vencedores respeitados do passado aparecendo como juízes do Planeta Krypton para julgar cada novo indicado com pequenas e certeiras criticas sobre o trabalho de cada um. Eu senti um clima meio American Idol nas falas, que oscilavam entre o paternal/maternal (Anne Hathaway sendo elogiada por Shirley MacLaine soou como uma adorável netinha sob os olhos experiente sda sua severa avó). De qualquer forma, coisas bonitas saíram daí, no geral.

A presença de Milk no páreo rendeu alguns momentos que, imagino, devem ter batido forte entre telespectadores conservadores em toda a área continental dos EUA. Duas vezes a cena de beijo entre Sean Penn e James Franco foi mostrada, e os discursos carregados de “liberte-se” e tolerância também foram bons e fortes, mensagem dada.

Hugh Jackman, super competente, sumiu durante um tempo, voltando rumo ao final. Estranhamente, sua competência passa agora como a competência de um bem calibrado puppet, sem nenhuma personalidade em especial, certamente sem a aura de comentarista de Jon Stewart. Mas, Jackman foi tranqüilo e parecia estar gostando.

Vão aqui umas anotações feitas durante, pequenos momentos, algumas piadas ditas, observações de caderno.

Hugh Jackman vai fazer NOVA ZELÂNDIA por causa da crise.
O caba até que é bom.
I haven’t seen The Reader. (eu também).
“I am a slumdog, I am a wrestler, I am Wolverine”. O caba dança, olha só.
Jackman engraçado, homenagem a Streep (15 indicações).
Homenagens bonitas a cada atriz e performance. Eva Marie Saint, Oscar de Coadjuvante por ON THE WATER FRONT, e alluminus de Hitchcock, uma das quatro no palco (Anjelica Houston, Tilda Switon, Goldie Hawn as outras). Homenagem à performance de Penélope Cruz simpática. Bonito texto sobre papel de Tarah GB Henson em O Curioso Caso de Benjamin Button.

PENELOPE CRUZ por Vicky Cristina Barcelona
Melhor Atriz Coadjuvante

Ela lembrou de coração Almodóvar, Bigas Luna e Fernando Trueba. Bacana.
5 minutos só para Atriz Coadjuvante, duração recorde?

Sketch de roteiro engraçada, Tina Fey e Steve Martin, “escrever é viver para sempre”, “o homem que escreveu isso já morreu”.

MILK Dustin Lance Black, discurso emocionado sobre a possibilidade de ser gay livremente. Uau, TVs sendo desligadas em Biloxi, Mississipi.

SLUMDOG MILLIONAIRE, Simon Beaufoy, Roteiro Adaptado. Hmm.

Jefrey Katzemberg (chefão da Dreamworks Animation, câmera claramente escrota) tentando rir com a piada de Jack Black sobre ganhar grana com animação. “Eu faturo com a Dreamworks (Black fez Kung Fu Panda) e aposto nos Oscars da Pixar (Wall-e)”.

Melhor animação, WALL-e.
Andrew Stanton agradece a Steve Jobs (Apple) e John Lasseter por criar um oásis criativo, a Pixar.

La MAISON EN PETITS CUBES (achei que seria Presto)
O japonês sabia pronunciar SÂNKIÚ.

O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON Direção de Arte. Ok e tal.

A DUQUESA, Figurinos. Hm.

Maquiagem. O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON. Amigo meu diz que Button começa como Zagalo. Hm, ok.

Menina de Mamma Mia e caba de Twilight lendo de cartolinas. Thunderbirds are Go!

Natalie Portman com problemas ao lado de Joacquin Phoenix (eu acho que é ele), que considera fotografia como nova carreira. “Soube que Slumdog foi feito com uma câmera de celular”. Acho que ele confundiu, foi feito para ver em celular!

Anthony Dod Mantle, fotografia SLUMDOG MILLIONAIRE. O filme não é todo em digital, mas muita coisa foi feita em digital. Perfeito prêmio de transição, em 2008, para fotografo que sempre trabalhou com o digital (Dogville, Manderlay).

CURTA (eu previ. O curta de Holocausto!) TOYLAND (Spielzeugland).

Jackman outra vez com numero musical, “Mamma Mia vendeu mais ingressos do que Titanic na Inglaterra”, menina simpática de vermelho. West Side Story, Grease, Noviça Rebelde, Moulin Rouge, Evita, Mamma Mia. Er... a simpática era Beyonce Knowles.

Christopher Walken, caba bom. Cuba Gooding Jr, Alan Arkin, Kevin Kline.
Heath Ledger.

ATOR COADJUVANTE Heath Ledeger.
Família de Ledger foi pegar o prêmio, “em nome da linda Mathilda”.

Imagem bizarra do Oscar, Werner Herzog refletindo sobre a verdade da imagem na cerimônia do Oscar no ano de 2009. Valeu Werner. (que estava no recinto, ansioso como um curta metragista).

MAN ON WIRE Documentário. Philipe Petit me confirmando que ele simplesmente não existe.

Smile Pinki, DOCUMENTÁRIO CURTA

EFEITOS VISUAIS, Benjamin Button Curioso (antecedido por montagem enxaquêca de filmes de ação).

MONTAGEM DE SOM The Dark Knight

MIXAGEM DE SOM Slumdog Millionaire.

MONTAGEM Slumdog Millionaire

Prêmio para Jerry Lewis foi transformado num prêmio humanitário, o Jerry Lewis que conhecemos estranhamente omitido. Se a idéia do prémio é essa, vergonha, então. O quê agora? Brian de Palma reconhecido pelo seu trabalho com cerâmica de barro reciclável?

Hugh Jackman curiosamente sumido da cerimônia.
Ok. Jackman voltou pra apresentar Trilhas.

TRILHA ORIGINAL Slumdog Millionaire A.R. Rahman
Rahman acaba de ganhar e já está no palco interpretando as músicas às quais concorre.

MÚSICA ORIGINAL “Jay Ho” A.R. Rahman. “Minha vida inteira tive a chance de escolher entre amor e ódio, escolhi sempre o amor, e estou aqui”, bom letrista populista.

FILME ESTRANGEIRO -- ???? --- Departures, do Japão. Os velhinhos da Academia devem ter jogado os DVDs pro alto e o japonês caiu no círculo de giz no chão. Nada de Entre Les Murs ou Waltz With Bashir. O diretor japonês parece ser fã de Terminator, de James Cameron. Por algum motivo oriental estranho, ele finalizou com “I’ll Be Back”.

DIRETOR Danny Boyle, Slumdog Millionaire. Boyle agradeceu Winnie the Poo e ao povo de Mumbai.

Sophia Loren, Marillon Cotillard, Nicole Kidman, Hale Berry, Shirley MacLaine. As cinco chegam e falam para as indicadas como se fossem do júri do American Idol (ou America’s Next Top Model), dando um texto sobre o que fizeram, como fizeram, onde acertaram e sempre terminando com um “obrigado”. O mais simpático foi o ofegante sotaque francês de Cotillard, “thank you”, que gracinha.

MELHOR ATRIZ Kate Winslet (ofegante novamente), melhorando com humor inglês a performance do Globo de Ouro. Pediu para o pai assoviar onde estava (simpático).

Robert de Niro, Michael Douglas, Sir Ben Kingsley, Adrien Brody, Anthony Hopkins.

De Niro sobre Penn: “como ele conseguiu fazer heterossexuais durante tanto tempo?”

MELHOR ATOR – Sean Penn – MILK
“Lei igualitária para todos”. Dedicou prêmio a Rourke.

Montagem de FILME mesclaram MILK com Mel Gibson gritando palavras de ordem em Braveheart, clara cutucada em Gibson homofóbico. Essas coisas que valem a pena ver o Oscar.

FILME Slumdog Millionaire. Essas coisas que fazem a gente não levar o Oscar a sério. Hehehe.

Sunday, February 22, 2009

Man on Wire (O Equilibrista)


por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


Oscars e Razzies têm essa capacidade de te fazer lembrar momentaneamente de imagens vistas ao longo do ano passado, mais até (no meu caso) que numa tentativa de fazer listas em dezembro. Acho que pelo fato de os filmes já chegarem em listas, você olha o título e lembra do mesmo. Um dos que mais me impressionou ao longo do ano foi o Man on Wire, de James Marsh, cotado para ganhar Documentário (a Califórnia Filmes mandou email informando que o filme será lançado em abril no Brasil).

O que mais me impressiona no filme não é o exercícico de cinema em si, mas algo totalmente inerente ao mesmo, seu personagem principal, Philippe Petit. Esse francês me fez repensar totalmente a figura do artista.

Há essa dimensão filosófica para o artista, criador e 'performer', e na maneira que nós observadores nos relacionamos com ele/ela. Normalmente, a recepção da criação é muito associada à decodificação de signos e de toda uma bagagem cultural, emocional e intelectual que nos leva à valorização da arte.

No entanto, há pouquíssimos casos onde a criação específica de um determinado artista é tão espetacular em termos de conceito, realização, provocação e acabamento que o efeito da sua arte parece fazer ligação direta entre o olhar e o estômago, deixando que o cérebro e a alma se dêem conta da riqueza do todo tempos depois, ainda assim gerando enorme prazer intelectual.

Petit é um desses raros criadores.