Friday, January 23, 2009

Ao Entardecer



Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


Ao Entardecer (Evening, EUA/2007) tem todos os trejeitos do produto de "bom gosto" comercial. Medido e pesado, ao que parece, para conquistar prêmios de prestígio como o Oscar, a fotografia tem sempre um brilho dourado não importa aonde no quadro, a morte via câncer é serena e elegante e o cartaz do filme destaca orgulhosamente suas atrizes peso pesado como a razão de ser do todo. De fato, Vanessa Redgrave, Meryl Streep, Claire Danes, Glenn Close, Natacha Richardson e Toni Collette comprovam que este é um produto embalado para o mercado consumidor feminino e maduro, um antídoto para High School Musical e provável programa para anteceder um chá no final da tarde.

O esquema projetado para o Oscar não deu certo, Ao Entardecer passou em branco na última temporada da Academia, ninguém sabe o porquê. O filme do fotógrafo húngaro Lajos Koltai (atualmente cineasta) é tão mecânico quanto qualquer outro produto vencedor de estatuetas douradas, como Rain Man, Conduzindo Miss Daisy ou As Horas. O roteirista Michael Cunningham, aliás, é o mesmo de As Horas e, para completar, o esquema narrativo é precisamente o mesmo de O Curioso Caso de Benjamin Button.

Dividido entre o presente e o passado, a personagem principal é a cantora de jazz Ann (a inglesa Redgrave, crente de que está num filme melhor), em leito de morte, cuidada pelas filhas Nina (Collette) e Constance (Richardson, filha de Redgrave na vida real) numa linda casa grande e americana. Balbuciando lembranças dopadas com morfina, Ann recorda-se de um incidente nos anos 50, e entram flashbacks da sua juventude onde, misteriosamente, a personagem se transforma na muito americana Danes.

Ann era a amiga boêmia de Buddy (Hugh Dancy), universitário rico, sofisticado, provavelmente gay, que a convidou para o casamento da irmã dele, Lila (Mamie Gummer, filha de Streep na vida real), num final de semana. Lila casou com um chato na luxuosa casa de praia da família.

Embora ame loucamente Harris (Patrick Wilson), o filho idealista da governanta, rapaz que venceu na vida ao tornar-se médico, e também ali presente, Lila casa-se com o bobão. Harris também atraiu a jovem Ann naquele final de semana conturbado que marcou a todos. De volta ao presente, as filhas tentam entender palavras soltas ditas pela mãe, com curiosidade especial para saber quem é esse tal de Harris que ela tanto fala, inconsciente.

Não há nada de errado com uma história clássica como esta, a saudade do passado e da juventude são temas humanos imortais, a iminência da morte, o balanço de uma vida, potencial de beleza há. É mais o tratamento convencional de papel de carta, com musiquinha genérica que vulgariza emoções e as paisagens de revista de turismo, personagens que parecem sobras de uma adaptação apressada (baseado num livro de Susan Minot), psicologia fácil (a filha Nina irá aprender uma grande lição de vida, para sempre e sempre). Na verdade, a questão é essa, aceitar ou não uma caricatura confeitada da própria vida. Dependendo da sua visão, pode ser frustrante.

Filme visto no Cine Rosa e Silva, Recife, outubro 2008.

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