Thursday, September 3, 2009

A Orfã


Comunista toca Tchaikovsky.

por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


A bobagem mais divertida da semana é o filme de criança peste A Orfã (Orphan, EUA, 2009), exercício de horror que visa conquistar públicos adultos com notável grosseria, cortesia da produtora Dark Castle Entertainment, selo especializado. O diretor espanhol Jaume Collet-Serra, que fez A Casa de Cera (House of Wax, 2005) para a mesma produtora, parece mostrar mais comprometimento com a causa do que a média dos colegas no gênero.

Que fique clara a vocação de A Órfã para o produto classe B, onde nada realmente faz muito sentido, mas, mesmo assim, a coisa flui como sangue num chão em declive. Mulheres grávidas, por exemplo, bom evitar, vide a seqüência de abertura verdadeiramente horrorosa.

Esse pesadelo inicial estabelece problemas no casal Kate (Vera Farmiga) e John (Peter Sarsgaard). Ela perdeu um bebê recentemente, e lida com alcoolismo. Os dois são pais de um garoto e uma caçula, que é surda. A necessidade de recuperar a terceira criança perdida os leva a um orfanato, onde encontram a aparentemente adorável garotinha de nove anos de idade, Esther (Isabelle Fuhrman). Esther é de origem russa.

Vale ponderar que, três semanas atrás, o muito bom Arraste-me Para o Inferno, de Sam Raimi, nos trouxe uma associação entre o bem (garota americana como torta de maçã) e uma senhora malvada do leste europeu que rogou praga na indefesa heroína. Todos os outros personagens associados ao mal eram estrangeiros, do leste europeu, com sugestão de que eram ciganos.

Em A Orfã, Esther, que irá revelar-se os pés da besta, é uma russa, e se lembramos que o canibal Hannibal Lecter de O Silêncio dos Inocentes era da Lituânia, temos aí uma observação válida sobre a maneira que a cultura de massa americana ainda trabalha fantasmas políticos relacionados ao mundo comunista.

Num repeteco do que vimos em O Anjo Malvado (The Good Son, 1993), onde Macaulay Culkin azedava uma família que o acolhia, Esther vai aos poucos revelando-se. Intimida os irmãos, incidentes estranhos ocorrem com ela por perto, que sempre ganha o benefício da dúvida por ser impossível criança de nove anos de idade fazer coisas do tipo.

O filme tem desenvolvimento de personagens (especialmente a mãe) tão acima da media quanto o tempo de projeção (120 minutos). Farmiga investe mais energia do que se esperaria, e o seu enlouquecimento é crível, já que Esther joga com as tensões entre ela e o marido, personagem cuja burrice cai como uma luva para as exigências do roteiro.

De qualquer forma, é um thriller B capaz de mostrar um pombo sendo esmagado por uma pedra e de flertar com a pedofilia, antes da grande revelação final, antecedendo o confronto final em noite, claro, de tempestade. Demente e divertido.

Filme visto na UCI Ribeiro, Boa Viagem, Recife

2 comments:

Erika said...

Só uma observação, no Anjo Malvado o Macaulay Culkin era o filho legítmo, o outro menino é que era acolhido pela família (acho que os pais deles tinham morrido...)

CinemaScópio said...

É verdade Erika, o Frodinho era o adotado. Obrigado, KLeber