Saturday, February 13, 2010

'Gainsbourg: Vie Heroique'


Bardot/Casta e Gainsbourg/Elmosnino, compondo.


Da BD de Sfar, Gainsbourg e seu Doppelgänger, 'La Guele'.


Serge Gainsbourg - Bonnie and Clyde
Hochgeladen von scootaway. - Musikvideos, Sänger Interviews, Konzerte und mehr.
Bardot e Gainsbourg em 'Bonnie & Clyde'.


France Gall cantando Gainsbourg.


Whitney Houston et Gainsbourg chez Drucker
Hochgeladen von Elbarto1808. - Klicke hier für mehr Fun Videos.

Para quem não conhece, grande momento de Gainsbourg incorporando seu alter ego, 'Gansbarre'. Ao vivo, para toda a França, Gansbarre fala para Whitney Houston, "I want to fuck her"

Esse texto foi escrito antes da cobertura de Berlim.

por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


Já passa da marca de um milhão de espectadores nos cinemas franceses a biografia filmada Serge Gainsbourg – Vie Héroïque, sobre um dos maiores nomes da música na Europa. O compositor de Je t'aime... moi non plus e dezenas de partituras memoráveis, ex-amante de Brigitte Bardot, ex-marido de Jane Birkin e pai da atriz Charlotte Gainsbourg, morreu em 1991, aos 62 anos. Inseparável de cigarros Gitanes, Gainsbourg chegou ao final com o pé no acelerador, rebatizando-se cinicamente de ‘Gansbarre’, sua versão mais radical do artista bebum provocador. Sua origem judaica é um aspecto forte do filme.

O diretor de Gainsbourg – Vie Héroïque é um estreante, Joann Sfar, artista gráfico que lançou, junto com o filme, uma interessante ‘graphic novel’ para Gainsbourg, que trata como um personagem fantástico. No livro (capa dura, 431 páginas, Editora Dargaud), Sfar oferece desenhos de produção e expande idéias sugeridas no filme, que mistura aspectos convencionais de um biofilme do tipo, com toques de grande imaginação.

O filme junta-se a relatos de vida que o cinema francês tem filmado recentemente, como os filmes sobre Edith Piaf (La Môme) ou os dois sobre Coco Chanel (Coco Antes de Chanel, Coco & Stravinsky), com peculiar tratamento se compararmos com o clássico biofilme americano (sempre concluídos com um triunfo absoluto).

Gainsbourg, interpretado com incrível fidelidade física e de espírito pelo ator pouco conhecido Eric Elmosnino, foi o filho de imigrantes judeus russo. É não apenas assombrado pela perseguição aos judeus na Paris da 2a. Guerra, mas passa a assumir o design nazista de difamação. O judeu é representado num cartaz de rua como um monstro gordo e narigudo com múltiplas patas que tomam a França com olhos gananciosos. A criança Lucien (o nome original de Gainsbourg) desenvolve um “outro”, que o acompanha como um amigo imaginário.

Sfar escreve no seu livro que “não quis fazer um filme sobre a carreira de um cantor; mas sobre um poeta que decidiu conquistar a França ao apropriar-se da língua francesa. Não trata-se de uma biografia, mas de um relato épico.”

Gainsbourg, que pareceu inverter tudo o que seria diferente ao longo da sua vida, era reconhecidamente um homem feio. Seu talento e visão poética de mundo, no entanto, o levaram a conquistar uma série de mulheres não só belas, mas fortes, que o filme apresenta como num desfile, factualmente ligando cada mulher a uma fase específica de inspiração artística. E ainda ficaram de fora Françoise Hardy, Anna Karina e Catherine Deneuve.

Está tudo lá, de forma um tanto burocrática, alguns dos grandes sucessos de Gainsbourg não apenas musicalmente, mas também emocional e sexualmente, ainda que essa sensação de narrativa previsível seja quebrada pela atualização do duplo na idade adulta de Serge.

Essa criatura (“la gueule” em francês, termo provavelmente intraduzível, “fuça” talvez chegue perto) uma caricatura dele mesmo, sempre preparada para inspirá-lo em direção à boêmia e à safadeza. É seu anjo da guarda apaixonado e ciumento, num trabalho de expressão corporal curioso do ator Doug Jones, também visto sob pesada maquiagem em O Labirinto do Fauno.

Depois de fornecer dois enormes sucessos para a estrela adolescente francesa France Gall -Poupée de Cire, Poupée de Son e Laisse Tomber les Filles, usada por Quentin Tarantino em Death Proof -, Gainsbourg manipulou matreiramente a cantora com uma nova música, Les Sucettes (ver cinismo maravilha aqui, http://www.youtube.com/watch?v=7Nr0dUcrAU0). Gall não percebeu que, por trás da letra inocente sobre uma garotinha chupando bombom, existia, na verdade, interpretação sexual clara para todos. Foi um escândalo.

Brigitte Bardot, numa entrada em cena memorável (interpretada pela modelo Laetitia Casta, ótima), tem affair com Gainsbourg, com quem grava Bonnie & Clyde e Comic Strip, para citar duas clássicas. Foi musa inspiradora de Je T'aime... Moi non Plus, com quem gravou a primeira versão. O compacto não foi lançado, pois o marido dela na época não gostou nada nada.

Je T'aime... Moi non Plus foi efetivamente regravada pela próxima companheira de Gainsbourg, a modelo inglesa Jane Birkin (interpretada pela inglesa Lucy Gordon, que suicidou-se apos as filmagens).

Foi a relação mais duradoura de Gainsbourg, emocional e artisticamente, e que ganha no filme tratamento à altura. Sabe-se que Sfar e equipe tiveram total apoio de Birkin e da filha, Charlotte (vista há pouco em Anticristo). De alguma forma, Gainsbourg Vie Héroïque não transmite nunca a sensação de ser chapa branca. Talvez seja pelo fato de tanto a vida, como a arte de Gainsbourg, não ter nada, nunca, de chapa branca.

Filme visto no Jean Eustache, Bordeaux, Feb 2010

No comments: