Saturday, February 20, 2010

Mammuth


por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com


Não é possível ignorar os comentários da imprensa internacional em Berlim sobre a forma como o ator Gerard Depardieu aparece num dos seus dois novos filmes, ambos projetados na Berlinale. L’Autre Dumas, de Safy Nebbou, é sobre o escritor Alexandre Dumas, passou na Berlinale Special (e eu não vi), mas é em Mammuth (competição), filme de Benoit Delépine, que Depardieu parece ter chocado.

Ele é filmado como uma espécie de irmão gordo do Lutador, de Mickey Rourke, cabelos longos e loiros, redondo na forma, às vezes nu em cena, sem pudores, total entrega. Obelix também seria referência. A reação da platéia chega a ser interessante dada a rejeição efusiva ao corpo de Depardieu.

O filme em si é um LA-DI-DA francês e granulado, filmado não apenas em baixa resolução, mas no que aparenta ser a intenção de fazer o filme mais visualmente feio da era moderna. Granulado como uma câmera de segurança e verde escuro no tom, Mammuth é inicialmente curioso, com suas observações da vida nas classes mais baixas da França, nas movimentações naturais de um ogro nos obstáculos do dia a dia.

Mais tarde, a julgar pelas minhas caretas discretas no escuro, talvez não passe de uma besteira com vôos de poesia de má qualidade, e ar artsy-biruta. A base aparenta ser o sentimento de passagem do tempo na vida, e há, de fato, um tom agridoce promissor.

Depardieu é um açougueiro que chega à aposentadoria sem os papeis necessários para ganhar sua pensão. Visita lugares onde trabalhou, como cemitérios e boates, à procura de documentos. Isabelle Adjani, numa estranha participação que valoriza seu rosto, é sua musa da morte, e cada novo encontro desse road movie pretensamente experimental garante os risos típicos dos filmes excêntricos.

Mammuth é uma aposta no grão e na gordura, e chega para Depardieu como um registro não apenas de pequenas pretensões artísticas, mas também dele próprio como corpo físico. De certa maneira, o filme enfrenta padrões de beleza, seja na imagem suja ou na falta de vaidade do seu astro, ocupando curioso espaço. Encolhe ainda mais após a sessão.

Filme visto no Cinemax 9, Berlim, Fev 2010

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