Thursday, January 21, 2010

Coco Antes de Chanel


por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com

Texto originalmente publicado no Jornal do Commercio

Ano passado, dois projetos rivais foram lançados enfocando a figura da estilista francesa Coco Chanel. O filme de encerramento do Festival de Cannes, Coco & Stravinsky, dirigido por Jan Kounen, e o outro Coco Antes de Chanel (Coco Avant Chanel, França), de Anne Fontaine, o mais insosso dos dois. De qualquer forma, esse segundo filme tem o valor agregado de ter a estrela Audrey Tatou (Amélie Poulain), atualmente o rosto das publicidades Chanel No.5 no mundo.

O filme segue a linha de biofilmes que interessam ao mercado. Há três anos, o cinema francês fez o muito bom Piaf, sobre a cantora, Hollywood, ano passado nos deu o ótimo Milk, de Gus Van Sant, sobre o político de São Francisco Harvey Milk, e o cinema Brasileiro nos dá atualmente a novela das seis de apenas um capítulo Lula – O Filho do Brasil. Para completar, essa semana estreou na França Serge Gainsbourg, Vie Héroïque, a biografia dramatizada do astro pop francês Gainsbourg.

Coco Chanel é uma personagem que parece inspirar enorme curiosidade, material certo para esse tipo de produto. É enigmática, uma artista nata, glamourosa, feminista antes do termo existir, amante de homens importantes, inclusive, durante a guerra, de um oficial nazista, fato ignorado por esses dois filmes.

Em Coco Antes de Chanel, o enfoque vai meio que ao pé da letra, mostrando a garota que existia antes do mito criador de estilos e modas, mas já nos mostrando pistas. Curiosamente, esse filme termina mais ou menos onde Coco & Stravinsky (que aguarda lançamento no Brasil) começa, na época da I Guerra.

Tatou certamente tem a presença e os nervos para nos dar um retrato bem orgânico de Chanel. Fica linda com um cigarro no bico, cara de desdém por quase tudo, revelando paixão em pequenas atitudes e ações. E como fotografa bem essa garota.

As intenções de Fontaine, no entanto, parecem deixar o filme duro como uma tabica, monocórdio, com ar constante de um ensaio de moda filmado. Nos mostra a pequena Coco desde a infância, no caso dela num orfanato. Mais tarde, ganha uns trocados em cabarés de segunda categoria de Paris, onde sua capacidade de atrair homens poderosos é inaugurada.

Atrai um bon vivant chamado Étienne Balsan (Benoît Poelvoorde), que a adota como amiga, amante e mulher, sempre sem qualquer noção de possessão envolvida. Essa ética interessante bate com o outro lançamento da semana, Cheri, de Stephen Frears, embora Coco não seja, tecnicamente, uma cortesã.

Mesmo não sendo, Étienne a “empresta” para um amigo, Arthur 'Boy' Capel (Alessandro Nivola), o primeiro grande amor de Chanel. Esse inglês, também bon vivant, será o interesse amoroso do filme, para a discreta e civilizada dor de Étienne.

É um filme raso na sua capacidade básica de ser previsível e também assistível, apelando para um encerramento que parece trair o título em troca de uma celebração do mito da moda e da alta costura. Parece menos sobre substância, e mais sobre aparência, a acusação lógica e tradicional para todas as coisas fashion.

Filme visto no Arteplex Botafogo, Rio de Janeiro, Novembro 2009

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