Tuesday, January 19, 2010
Gigante
por Kleber Mendonça Filho
cinemascopio@gmail.com
Texto originalmente publicado no Jornal do Commercio
Com o mundo do cinema dividido entre os produtos do mercado internacional, via Hollywood, e os filmes menores, feitos fora desse esquema, percebe-se algo de curioso nas trincheiras dessa produção independente internacional, na qual os filmes brasileiros fazem cada vez mais parte. O simpático filme uruguaio Gigante (2009), filme de Adrián Biniez, talvez seja um exemplo.
Logo nos créditos de abertura, assusta o número de fundos internacionais de apoio e oficinas de roteiro de consultores estrangeiros pelas quais o filme passou na sua construção. Teme-se que o que veremos levou tanta tapa, pitaco e sacolejo que, quem sabe, o resultado final mostre isso negativamente. De certa forma, é mais ou menos o que se confirma ao longo da projeção.
Gigante se passa numa periferia de Montevidéu. Os dois personagens são Jara (Horacio Camandule) e Julia (Leonor Svarcas). Ele é um tipo alto e forte (gordo), o segurança do supermercado onde Julia trabalha como faxineira. Ela é uma mulher atraente, aparentemente solteira e solitária. É o clássico mito de bela e fera.
Jara é construído como um ogro de coração de mel, metaleiro pacifista que, se a coisa apertar, quebrará a cara de alguém. Ele sente-se atraído por Julia, mas é tímido demais para chegar perto, especialmente quando tem ao seu dispor o sistema de vigilância eletrônica do supermercado, que passa a utilizar como mecanismo de sua paixão platônica.
Dando um passo alem, passa a seguir Julia fora do trabalho, e logo alguns poderão lembrar de Não Amarás (1988), de Krzysztof Kieslowski, embora as ambigüidades do filme polonês nunca realmente se concretizem nesse aqui.
Na verdade, chama a atenção que Gigante seja um filme que segue uma linha reta simpática totalmente pré-programada, sem surpresas, desvios ou picos de interesse. Há um humor robótico à vista que, com enorme boa vontade, poderia lembrar Buster Keaton, mas sem qualquer traço de sarcasmo ou acidez em relação às relações humanas ou a vida numa sociedade vigiada e globalizada (o supermercado, por exemplo).
Especialmente rumo ao final, o filme revela que sua intenção era ser, desde o início, um relato lacônico de tom fofinho, e que deixa muito pouco para o espectador no sentido de uma lembrança. Suspeita-se que intenções originais tomaram o rumo do agrado superficial, algo que pode levar o filme a ser desfrutado por alguns.
Gigante esteve na competição do Festival de Berlim, ano passado, onde ganhou o Urso de Prata e Melhor Filme de estreante.
Filme visto no Berlinale Palast, Berlim, Fevereiro 2009
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